Fux pede vista e suspende julgamento de recurso de Moro contra acusação de…Ver mais

“Brincadeira” em festa junina coloca Sergio Moro na mira da Justiça: julgamento é suspenso e clima esquenta nos bastidores do STF
Por trás de um sorriso e uma fala descontraída em uma festa junina, um ex-juiz e atual senador pode ter cruzado a tênue linha entre a liberdade de expressão e o crime de calúnia. O que começou como uma piada, ganhou contornos de embate jurídico — e agora, tudo está temporariamente suspenso, à espera do próximo movimento de um dos ministros mais discretos do STF.
Tudo parecia apenas mais uma noite de celebração. Balões, bandeirinhas, comida típica e sorrisos. Entre os convidados, o senador e ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro, circulava de forma descontraída. Mas bastou um comentário captado por vídeo e disseminado nas redes sociais para desencadear um dos episódios mais delicados de sua trajetória política: “comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes”.
A frase, dita em tom de brincadeira durante o evento em abril de 2023, rapidamente viralizou e provocou uma reação inesperada e potente: a Procuradoria-Geral da República (PGR) viu ali não apenas uma piada de mau gosto, mas um ataque direto à honra do ministro Gilmar Mendes, que integra o Supremo Tribunal Federal (STF). A vice-procuradora Lindôra Araújo, então braço-direito do ex-PGR Augusto Aras, assinou a denúncia por calúnia — crime que pode levar à perda de mandato caso a pena ultrapasse quatro anos.
A partir daí, o caso entrou no radar da Corte Suprema. Quatro ministros já haviam votado para rejeitar um recurso da defesa de Moro, que tentava barrar a denúncia. Os votos de Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Flávio Dino foram firmes na manutenção da acusação. Restava apenas um voto: o do ministro Luiz Fux.
Mas foi exatamente Fux quem puxou o freio de mão.
Com um pedido de vista — recurso regimental que suspende temporariamente o julgamento para análise mais profunda — o processo agora fica paralisado por até 90 dias, prazo máximo para devolução à pauta. Enquanto isso, a incerteza paira no ar.
O peso das palavras — mesmo em tom de brincadeira
A relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, não viu margem para reconsideração. Em seu voto, ela foi taxativa: o recurso da defesa não apontava falhas formais, omissões ou contradições que justificassem novo debate. “Sob o pretexto de sanar vícios inexistentes, busca-se a rediscussão do acórdão pelo qual recebida a denúncia”, afirmou.
Nas redes sociais, Sergio Moro reagiu à ofensiva com o tom combativo que o tornou conhecido durante sua atuação na Operação Lava Jato. Classificou a denúncia como “inepta, contrária ao Direito, aos fatos e ao bom senso”. E disparou: “Trata-se de uma piada de festa junina, não de um ataque pessoal”.
E completou com uma mensagem cifrada, de cunho moral: “Quem tem a consciência tranquila perante a lei, a verdade e a justiça de Deus, nada tem a temer”.
Entre a fogueira da tradição e o fogo cruzado da política
A defesa de Moro insiste na tese de que o comentário foi apenas uma brincadeira típica das festas juninas, sem qualquer intenção ofensiva. Em vídeos divulgados posteriormente, a deputada Rosângela Moro (União Brasil-SP), esposa do senador, tenta contextualizar a situação com bom humor: “Se alguém dá cincão, você fica mais dez minutos preso. Não é uma boa ideia?”
O advogado de defesa, Luis Felipe Cunha, reconheceu que a fala foi “infeliz”, mas reiterou o respeito de Moro por Gilmar Mendes. “Nunca houve intenção de ofensa. Muito menos calúnia. Foi apenas um comentário fora de hora, captado fora de contexto.”
Liberdade de expressão ou ofensa? O debate que não se apaga
A suspensão do julgamento não esfriou o debate público. Pelo contrário. O caso virou combustível para discussões intensas sobre os limites da liberdade de expressão, principalmente quando se trata de figuras públicas com grande projeção política.
Para apoiadores de Moro, a denúncia seria uma tentativa clara de retaliação política. Já para críticos, o episódio escancara a necessidade de responsabilidade no discurso público, mesmo — e talvez principalmente — quando revestido de humor.
No pano de fundo, uma dúvida permanece: até que ponto um comentário, por mais informal que seja, pode ser interpretado como crime contra a honra de um ministro da Suprema Corte? E mais — será possível separar o Moro político do Moro ex-juiz, quando o palco é o STF?
Enquanto o voto de Luiz Fux não é conhecido, o processo segue em compasso de espera. Mas uma coisa é certa: o episódio não será esquecido tão cedo. E, ao que tudo indica, ainda promete novos desdobramentos nos bastidores do Judiciário e da política brasileira.
