Ato de Bolsonaro é esvaziado e marcado por fal…Ver Mais

Silêncios que ecoam: o que a nova manifestação de Bolsonaro revelou — e omitiu
Por trás das bandeiras tremulando na avenida Paulista, um novo capítulo político começa a se desenhar em silêncio. No último domingo, 29 de junho, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou ao epicentro das manifestações bolsonaristas: a emblemática Paulista, em São Paulo. O objetivo era claro — pressionar por anistia aos investigados e condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Mas, por trás dos discursos inflamados e do patriotismo em verde e amarelo, algo soava diferente. Menor em público, mais discreto em tom e cercado por ausências estratégicas, o evento expôs fissuras sutis no outrora coeso movimento da direita radical.
A avenida, palco de tantas demonstrações massivas do bolsonarismo no passado, desta vez ofereceu apenas um trecho ocupado. Em contraste gritante com as multidões que vestiram a Paulista de verde e amarelo em atos anteriores — como o de fevereiro, que chegou a paralisar quarteirões inteiros —, o número de presentes decepcionou até mesmo os organizadores mais otimistas.
Mas os olhos atentos dos analistas políticos não estavam apenas no público. O que realmente chamou atenção foi quem não apareceu. Nomes que, até pouco tempo, eram presenças garantidas ao lado de Bolsonaro, simplesmente sumiram do radar.
Ausências que falam alto
Ratinho Júnior (PSD-PR) e Ronaldo Caiado (União-GO), dois governadores com pretensões presidenciais em 2026, optaram por não comparecer. Coincidência? Nos bastidores, o silêncio foi interpretado como um afastamento calculado — uma tentativa de descolar suas imagens da ala mais radical do bolsonarismo.
Mas a ausência mais comentada talvez tenha sido a de Michelle Bolsonaro. Cotada como possível candidata à Presidência e com alto índice de aprovação entre o eleitorado conservador, a ex-primeira-dama não apareceu e não se pronunciou. Seu sumiço alimentou boatos sobre um racha silencioso dentro do PL e tensões veladas entre lideranças.
As peças do tabuleiro se movem
Senadores como Ciro Nogueira (PP-PI) e Rogério Marinho (PL-RN), figuras-chave do bolsonarismo no Congresso, também optaram por não marcar presença. Já o ex-ministro do Turismo, Gilson Machado (PL-PE), conhecido por sua fidelidade incondicional ao ex-presidente, justificou sua ausência por estar proibido judicialmente de deixar Recife — decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que foi criticada abertamente durante os discursos no evento.
Outra ausência surpreendente foi a do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), estrela em ascensão da direita digital. Jovem, carismático e com forte apelo nas redes sociais, sua ausência, sem explicação oficial, foi vista como mais um sinal de alerta sobre o momento de reavaliação interna no bolsonarismo.
Quem ainda está com Bolsonaro?
Apesar dos vazios visíveis, o palanque não estava completamente esvaziado. Quatro governadores — Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Romeu Zema (Novo-MG), Cláudio Castro (PL-RJ) e Jorginho Mello (PL-SC) — subiram ao trio elétrico. Ao lado deles, senadores como Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Magno Malta (PL-ES), além de deputados como Marco Feliciano, Bia Kicis, Gustavo Gayer e Sóstenes Cavalcante, mantiveram o tom de confronto contra o STF e reforçaram o pedido por anistia.
Mesmo com um público menor e clima menos efusivo, Bolsonaro manteve seu estilo combativo. Em seu discurso, agradeceu aos presentes, atacou o Supremo Tribunal Federal e clamou por “justiça” para os apoiadores presos. O evento, cercado de orações, bandeiras do Brasil, de Israel e até dos Estados Unidos, teve um ar mais contido, mas não menos simbólico.
O silêncio ensurdecedor de um movimento em transição
Enquanto os alto-falantes amplificavam vozes em tom de resistência, o que realmente reverberava na Paulista era o silêncio dos ausentes. A manifestação deste domingo não apenas reuniu apoiadores — ela escancarou, de forma sutil porém inegável, uma reconfiguração em curso no movimento bolsonarista.
Com investigações em andamento, condenações pesando sobre aliados e o próprio ex-presidente sob risco de inelegibilidade, parte da base política parece optar por recuar, ao menos por ora. O bolsonarismo, embora ainda influente, parece viver um momento de pausa estratégica, de redefinição de papéis e reposicionamentos silenciosos.
A pergunta que permanece no ar, ainda sem resposta clara, é: quem continuará ao lado de Bolsonaro quando os holofotes se apagarem? O ato deste domingo pode não ter respondido — mas certamente deixou essa dúvida ecoando pelas calçadas da Paulista.
